Reflexos outonais.

POR DETRÁS DA IMAGEM

Texto e fotografia por Miguel Serra

O outono é porventura a estação do ano mais aguardada pelos fotógrafos de paisagem natural, na procura das cores exuberantes das florestas caducifólias. As condições meteorológicas instáveis ajudam na criação de verdadeiros cenários bucólicos. A paisagem em mutação capta atenções e desperta novos olhares.

A transformação da cor das folhas das faias, das bétulas, dos carvalhos e dos castanheiros, entre outras árvores de folha caduca, está associada à diminuição do tempo de exposição solar, obrigando as plantas a suspender o processo da fotossíntese. A clorofila não sendo mais necessária, acaba por ser extinta e a cor verde vai desparecendo, dando lugar a outras cores que estavam ocultas.
Esta mudança é bem evidente nalgumas zonas da Serra da Estrela, nomeadamente nos bosques das encostas sobranceiras à vila de Manteigas, locais que conheço bem e que frequento regularmente por razões de proximidade.
São experiências reconfortantes caminhar entre veredas outrora calcorreadas pelos pastores da Serra da Estrela e os seus numerosos rebanhos, bem como trilhar o manto húmido outonal, onde as folhas caídas à sua sorte dissimulam fungos e outras espécies da flora deste tempo efêmero.
Contudo, a fotografia aqui revelada representa o final da estação do outono, registada no Covão da Ametade, em Manteigas, no dia 02 de janeiro de 2022. Uma imagem que abriu a série “The world at my feet” (“O mundo aos meus pés”) e faz parte da galeria do projeto “The Print Circle”, que pode ser consultado através do seguinte link: https://printcircle.pt
O Covão da Ametade, é um dos locais mais emblemáticos da Serra da Estrela, proveniente de uma antiga lagoa de origem glaciar, a 1.420 metros de altitude. Preenchido por relvados naturais (cervunais) e cercado em boa parte pelos maciços rochosos de granito, com destaque para o Cântaro Magro, este anfiteatro natural é rasgado a meio pelo Rio Zêzere no início do seu percurso, dividindo o local em duas partes semelhantes, daí a designação ‘Covão da Ametade’.
Presentemente, admito que o meu olhar contemplativo recai muito mais sobre os pormenores que se transfiguram a cada estação do ano. Nesta tarde pelo Covão da Ametade passaram inúmeros visitantes, pois mal havia lugar para estacionar nas imediações. Será que terei sido só eu a debruçar-me sobre esta poça de água? Acredito que os mais atentos, certamente conseguiram, pelo menos, observar refletidos os troncos das bétulas ladeadas pelas folhas caducas, nesta ou noutra poça de água qualquer!

Composição
A imagem divide-se em duas partes distintas. A zona totalmente focada, composta pelo reflexo dos troncos das bétulas na poça de água, e uma área menor que complementa a cena, ornamentada pelo desfoque das folhas caducas.
Observando atentamente a fotografia, facilmente se compreende que as duas metades se encaixam na perfeição. Na parte superior destaca-se a verticalidade dos troncos das árvores a despontarem no reflexo da água e na parte inferior as folhas caducas rematam a composição.
No que concerne às tonalidades, importa também referir que as duas combinam entre si. A cor azulada do reflexo e as cores ocres das folhas outonais.

Dicas
Para a realização deste tipo de fotografia é aconselhável que não haja muito contraste entre as altas luzes e sombras.
A qualquer hora do dia posso ser criativo. Basta para isso estar atento aos pormenores da paisagem e ter um olhar sensível ao meio envolvente.
Embora a fotografia tenha sido conseguida com uma macro 80mm no sistema APS-C, equivalente a 120mm no full frame, este género de imagem pode também ser concretizada com uma teleobjetiva.

Processamento
Através do Adobe Camera Raw ®, com base no ficheiro original, iniciei o meu fluxo de trabalho diminuindo levemente a exposição, aumentando de forma expressiva o contraste e os realces. De seguida, para conferir um maior equilíbrio à fotografia, senti a necessidade de reduzir as sobras e os pretos, elevando ligeiramente os brancos. Por fim, no Photoshop ® senti apenas a necessidade de algum ajuste na cor, essencialmente no que diz respeito à vibração e saturação.

Configurações da câmera
Câmera: Fujifilm XT4
Objetiva: XF 80mm F2.8 R LM OIS WR Macro

Distância focal: 80mm / Tempo de exposição: 1/50seg / Abertura: f/2,8 / ISO: 400 / Sem tripé

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