Caminhos gélidos.

POR DETRÁS DA IMAGEM

Texto e fotografia por Miguel Serra

Apresento-vos uma fotografia captada a 22 de janeiro de 2022, no Covão da Ametade, Manteigas, em pleno Parque Natural da Serra da Estrela, a cerca de 1500 metros de altitude. O berço onde o Rio Zêzere começa a ganhar forma.

Durante vários dias seguidos as temperaturas negativas fizeram-se sentir de forma impetuosa nas zonas mais altas da montanha, provocando a formação de gelo à superfície da água. Neste caso concreto, o frio criou esta poça gelada, no sopé do Cântaro Magro, num pequeno riacho quase estancado pelo frio, que mais a jusante desagua no Rio Zêzere.
Foram inúmeros os desafios fotográficos desta tarde de inverno. A imaginação levou a concentrar-me umas boas horas entre as linhas de água.
Esta imagem integra a série fotográfica “The world at my feet” (“O mundo aos meus pés”), por sinal uma das minhas preferidas do ano de 2022.
O Covão da Ametade é aquele lugar mágico que merece sempre uma atenta visita. Se no início do meu percurso fotográfico procurava a paisagem aberta deste majestoso lugar, nos dias de hoje o meu olhar contemplativo recai muito mais sobre os pormenores que se transfiguram a cada estação do ano. Aliás, uma visão que vale para muitos outros locais que frequento com regularidade.

Composição
O olhar fixa-se de imediato nas bolhas de oxigénio geladas no centro da fotografia. As linhas diagonais onduladas estabelecem harmonia e transversalidade. São caminhos que obrigam a deambular pela imagem. Os círculos são determinantes no equilíbrio de todo o conjunto, sóbrio, mas dinâmico. A cor azulada transmite o ambiente frio e gélido.
Uma composição simples, com um grande pendor estético e contemplativo.

Dicas
Para além de desafiante, fotografar a superfície da água gelada é um processo de grande criatividade para qualquer fotógrafo de paisagem natural. As cores, as linhas e as texturas facilmente transportam o nosso pensamento para qualquer outro planeta.
O ideal para fotografar este tipo de ambiente será utilizar uma objetiva macro ou, em alternativa, uma teleobjetiva. Para uma imagem completamente focada, caso seja esse o objetivo, recomendam-se a utilização de aberturas intermédias (f/13 a f/16).
O tripé pode garantir, à partida, o maior sucesso na nitidez das fotografias. Sendo que, na prática, os resultados podem ser igualmente bem-sucedidos ignorando-se a sua utilização, tendo sempre em conta um tempo de exposição suficientemente rápido para garantir a compensação do movimento que existe sempre – ainda que leve – no momento do disparo. Com tantos pormenores e composições a surgir em catadupa, o uso do tripé pode, de alguma forma, castrar a capacidade criativa do fotógrafo. O melhor será encontrar o equilíbrio na sua utilização, assumindo esse compromisso no terreno.

Processamento
Sempre investi mais tempo no terreno, procurando o melhor enquadramento e ambiente possível, em detrimento do que se gasta posteriormente no processamento das imagens.
Nesta fotografia em concreto, apenas foram efetuados alguns ajustes básicos, num breve processamento, que se esgotou em cerca de 20 minutos.
Com base no ficheiro original da câmera, a exposição foi atenuada ligeiramente. O contraste e os realces foram aumentados significativamente. Sem alterar as sombras e o ponto branco, senti a necessidade estética de reduzir os pretos para conferir mais contraste e profundidade. Por último, acrescentei alguma textura e claridade, bem como uma ligeira saturação.

Configurações da câmara
Câmara: Fujifilm XT4
Objetiva: XF 80mm F2.8 R LM OIS WR Macro

Distância focal: 80mm | Exposição: 1/80seg | Abertura: F5.0 | ISO: 400 | Sem tripé

© 2024 Miguel Serra